sábado, 10 de dezembro de 2011

Um dia para homenagear Clarice Lispector

A exemplo de Carlos Drummond de Andrade e seu Dia D, Clarice Lispector (1920-1977) ganha uma data em homenagem à sua obra, comemorada hoje, seu aniversário, com eventos em todo o Brasil sob o título Hora de Clarice. Uma das casas à frente desta iniciativa, coordenada por Paulo Gurgel Valente, filho da autora de A paixão segundo G.H., é a editora Rocco, que promove na Livraria Jaqueira (no Recife), debates e exibição de documentário sobre a escritora mais festejada do país e principal estrela de seu catálogo. Na programação que se incorpora à agenda da própria livraria, haverá palestra, leitura de textos da autora, exibição de documentário. Dentro do projeto Frentes da Psicanálise, organizado pelo psicanalista e escritor André Resende, debate com os psicanalistas Jacques Laberge, Ana Lúcia Falcão e Carlos Eduardo Carvalheira, a partir das 17h.

"A obra de Clarice sempre chamou a atenção da psicanálise, que supõe apreender muito da falta que as palavras promovem nas pessoas. Ou seja, da necessidade das pessoas contarem suas angústias de forma que as angústias se tornem mais esclarecidas. Clarice tem uma obra em que, a todo momento, as revelações das angústias se manifestam como narrativas. A Intersecção Psicanalítica do Brasil e outros grupos de psicanálise possuem grupos de estudos e grupos de leituras que se esforçam para imaginar o quanto da obra dela pode ajudar a seguir como um lugar onde a palavra é o principal meio de expressão", explica o coordenador do evento, promovido desde outubro, sempre no segundo sábado do mês.

Já o psicanalista Carlos Eduardo Carvalheira acena para intersecções entre a escritura de Clarice e noções centrais da psicanálise lacaniana. “Nesta relação entre literatura e psicanálise, há algo muito importante e mais presente na psicanálise lacaniana, que é a noção de ‘real’. Clarice fala deste mesmo ‘real’ lacaniano, mas poeticamente. Lacan, por exemplo, coloca o ‘real’ como aquilo que não deixa de se inscrever; e Clarice diz, por exemplo, ‘Capta essa coisa que me escapa e, no entanto, vivo dela; e estou à tona de brilhante escuridão’, dando conta de algo indizível, atingindo o mesmo ‘real’ com as palavras”.

“A psicanálise aprende com a literatura”, continua Carvalheira, autor de estudos sobre a escritora. “Hélène Cixous, psicanalista, coloca Clarice como maior escritor contemporâneo, difundindo seu trabalho em toda a França, Canadá e Estados Unidos. ‘É filosofia poética ou poesia filosófica? Enfim, algo que nunca vi em outro lugar e só há uma pessoa no mundo que produziu textos tão densos, que foi Kafka’, escreve.

Outra questão importante são as epifanias. “Toda a obra de Clarice é epifânica, e não existe quase ninguém que faça igual a ela. Temos James Joyce, cujas epifanias são muito ricas, lançando mão das metáforas de colisão, como as que Clarice usa. As metáforas de colisão agem segundo o princípio da tensão e da oposição. São metáforas mais aprimoradas, mais difíceis de serem percebidas”, conclui o psicanalista.

Por Paulo Carvalho, do Diario de Pernambuco

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